O propósito desta dissertação é descrever e analisar as relações tramadas entre humanos e não humanos na zona rural de Floresta, município localizado no sertão pernambucano, na Mesorregião do São Francisco. Essas relações interespecíficas são caracterizadas nesta etnografia a partir de distintas perspectivas, embora admitam como eixo condutor da análise a prática da criação de caprinos na solta. A princípio, por meio de uma análise contrastiva, demonstro como o laboro, atividade diária dos criadores, pode ser pensado em contraposição a uma noção de trabalho e à pecuária extensiva. O laboro é um conjunto de técnicas e procedimentos muito específicos que fazem parte desse modo de criação na solta, ambos (laboro e solta) condição de possibilidade para a compreensão das relações que as famílias mantêm com os animais e a caatinga. Os sinais, uma das técnicas utilizadas na solta, são recortes feitos à faca nas orelhas dos caprinos que, ao mesmo tempo, simbolizam e identificam o/a proprietário/a do animal e a família a que pertence. O laboro e os sinais são meios de efetivação e visualização de relações de parentesco. O laboro e a criação na solta permitem que os criadores produzam e conservem um conhecimento particular, uma expertise. E é por meio do nexo constituído entre criadores, criação e caatingas, dos seus afetos e das afecções de seus corpos que foi possível sugerir a ambivalência de uma noção de domesticação. Portanto, partindo do ponto de vista dos criadores e de suas famílias, descrevo como um modo de criação animal possibilita compreender relações interespecíficas em uma determinada região. Aqueles que conhecem as veredas, traçadas diariamente e ao longo de anos por cabras e bodes, conhecem as impressões e marcas na terra, registro de um modo de existência interespecífico.

Palavras-chave: Trabalho. Parentesco. Domesticação. Sertão de Pernambuco. Relações interespecíficas. Cabras e bodes. Caatinga. 

Dissertação de mestrado orientada pelo Prof. Dr. Jorge Luiz Mattar Villela (UFSCar), com coorientação do Prof. Dr. Felipe Ferreira Vander Velden.

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